Acordei. Essa noite eu traí a minha mulher. Não totalmente, eu sabia que tudo já estaria terminado pela manhã, mas o ato ainda foi considerado traição, embora a minha lógica cretina tente pensar que não. Traí. E o pior não foi pensar na dor dela ou que a perdi. Isso ia acontecer independente e eu também queria. Acordei com uma culpa insana, um medo, uma sensação de que todas as mulheres que eu conhecia, e provavelmente também as que eu nao conhecia e nem me conheciam, estavam profundamente decepcionadas com o que fiz, com desprezo ainda mais que raiva. Tudo o que eu via eram costas e caras de desaprovação. Minhas amigas, minhas melhores amigas, até as que nem a conheciam. Acho que nem falas tinha nesse delírio, mas uma imagem vale mais que mil palavras, e suas caras não deixavam dúvida: eu sou um merda!
Logo a fantasia rompe as rédeas do, ainda não achei a palavra, e como mil bizões selvagens começa a pintar um futuro negro de rejeição e solidão, de tristesa e arrependimento. Não rejeição dela, nem do mundo; é a rejeição de todo o mundo feminino, de todas as mulheres da minha vida e além dela, o que é bem pior. Um desfile de rostos decepcionados rodeia minha cabeça fazendo-me, nessa passarela, cada vez mais pequeno, mais insignificante, mais merda.
Não dá para descrever o que um homem sente com a desaprovação da ala feminina do mundo, e as mulheres têm dessas coisas, quando querem deixar um ponto claro. Sua união sobrepassa a camaradagem, a fidelidade entre iguais e o compromisso por classe ou por gênero. Seja como for sua organização no mundo prático, na cabeça do homem elas representam um único ser fractático disposto à mais violenta medida, em materia de rejeição, abandono e culpabilização, com a imensa habilidade de sugar o coração do homem, enebriando-o e deixando-o apodrecer numa conserva de sabor amargo e ácido. Sorrizos e graças não dissuadem esse ser e nenhuma mulher nunca o trai. Nem a mais vagabunda, interesseira e inescrupulosa, que te quer e que odiava a tua senhora. Nunca, nem ela. É um único ser.
É a tática perfeita de guerrilha. Os homens criam associações, clubes, governos, partidos politicos, torcidas, times de futebol. As mulheres fazem uma inseption bem feita logo ao nascimento, soterrada e agrilhoada por toda a infância, pela representante local delas, deste ser: a mãe.
Freud cheirou essa trama conspirativa e logo declarou que toda a culpa era dela. Mas ele não percebeu que ela nada mais era que uma obreira em prol de todas, em prol do ser único e imortal, que existindo ou não, é real na cabeça de todo homem
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